Nexo Técnico Previdenciário (NTP): Tipos, consequências para os empregadores e possibilidade de defesa
14 de outubro de 2025
Guilherme Vinicius Theodoro1
RESUMO
O presente artigo aborda o Nexo Técnico Previdenciário (NTP), instrumento utilizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para aferir a eventual relação entre patologias e atividades laborais. São analisados os diferentes tipos de nexo — Nexo Profissional (NP), Nexo Individual (NI) e Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP) —, suas implicações jurídicas, previdenciárias e econômicas para as empresas, bem como os mecanismos de defesa administrativa e judicial disponíveis para contestação de benefícios acidentários indevidamente concedidos.
O estudo demonstra que a correta compreensão e atuação frente ao NTP é essencial para a gestão de riscos empresariais, evitando impactos como recolhimento indevido de FGTS, manutenção do emprego por até 12 meses após a cessação do benefício, aumento da contribuição do Fator Acidentário de Prevenção (FAP), responsabilidade civil e trabalhista, e ações regressivas do INSS.
Além disso, o artigo detalha os procedimentos administrativos e recursos cabíveis para impugnar a concessão de benefícios acidentários, incluindo prazos, competências do Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS) e estratégias de contestação do NTEP. A pesquisa evidencia a necessidade de atuação preventiva e consultiva das empresas, de modo a assegurar que os benefícios sejam concedidos com base na realidade do afastamento e na correta classificação do nexo causal.
Palavras-chave: Nexo Técnico Previdenciário, NTEP, Nexo Profissional, Nexo Individual, benefícios acidentários, defesa empresarial.
INTRODUÇÃO:
Este tema, embora existente na legislação há mais de uma década, ainda apresenta lacunas de entendimento prático, especialmente na interseção entre direito previdenciário, medicina do trabalho e gestão de riscos empresariais.
Desde a Reforma da Previdência, em 13 de novembro de 2019, o direito previdenciário tem ganhado ainda mais notoriedade. No entanto, existem outros temas além das aposentadorias que continuam a gerar dúvidas e demandam atenção especializada. Entre eles, destaca-se o Nexo Técnico Previdenciário (NTP), cuja compreensão adequada é essencial tanto para a gestão empresarial quanto para a mitigação de riscos jurídicos e previdenciários.
Antes de adentrar no tema, é pertinente levantar uma questão: por que discutir um assunto que já integra a legislação pátria há mais de 10 anos? A resposta está na prática cotidiana do direito previdenciário aplicado às empresas. Atuando como advogado consultor previdenciário voltado especificamente para pessoas jurídicas, uma das minhas funções é avaliar empresas de diversos segmentos sob a ótica jurídica, auxiliando-as a conduzir suas demandas de forma segura e alinhada à legislação vigente.
Grande parte dos questionamentos empresariais envolve doença ocupacional, acidente de trabalho e as múltiplas consequências jurídicas desses eventos, que podem impactar desde obrigações previdenciárias até riscos trabalhistas e civis. Em outras palavras, prestar consultoria jurídica consiste em fornecer suporte especializado para que o cliente possa adequar seus interesses à lei, seja de maneira preventiva ou corretiva, atuando em processos administrativos e judiciais quando necessário.
Nessa jornada, pude identificar algumas das principais dúvidas enfrentadas por empregadores, especialmente nas áreas de Recursos Humanos, Segurança do Trabalho e Medicina do Trabalho. Apesar de o Nexo Técnico Previdenciário não ser um tema recente, essas questões permanecem atuais e frequentes, tais como:
“Nexo Técnico Previdenciário é o NTEP?”
“Há mais de um tipo de nexo?”
“Quais as consequências da aplicação do nexo causal entre patologia e trabalho para a empresa?”
“Como podemos agir diante da concessão de um benefício acidentário a um colaborador?”
Diante dessas inquietações, tornou-se evidente a necessidade de abordar o assunto de forma clara, detalhando conceitos, aplicabilidade prática e impactos legais para o empregador.
Portanto, neste artigo, meu objetivo é apresentar os pontos cruciais sobre o Nexo Técnico Previdenciário, bem como as normas legais que o regulam, oferecendo uma visão prática, acessível e objetiva, que auxilie tanto advogados quanto gestores a compreenderem e lidarem com a matéria de forma eficiente.
2 – DESENVOLVIMENTO
2.1 – CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO.
Faz-se necessária a perfeita compreensão sobre o processo administrativo de concessão dos benefícios para entendermos em que consiste, efetivamente, o Nexo Técnico Previdenciário.
Os benefícios previdenciários podem ser concedidos na espécie previdenciária (comum) ou acidentária, conforme decisão dos médicos peritos do INSS.
Em regra, quando o segurado comparece à perícia médica, o perito realiza duas análises independentes:
- Verificação da incapacidade laborativa: o perito avalia se o segurado está temporariamente ou permanentemente incapacitado para suas atividades habituais.
- Verificação do nexo causal com o trabalho: caso haja incapacidade, o perito analisa se há relação entre a enfermidade ou lesão apresentada e as atividades laborais desempenhadas pelo segurado.
No caso da emissão da CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), o perito, em regra, atribui a acidentalidade conforme denunciado. Entretanto, quando não há CAT, a análise do perito fica limitada quanto à origem da incapacidade, pois o segurado apresenta, em geral, apenas documentos médicos relativos à sua enfermidade, sem informações técnicas detalhadas sobre o ambiente de trabalho ou condições laborais.
Uma vez constatado que há indícios de que aquela enfermidade possa guardar relação com o trabalho do segurado, o médico perito do INSS, e tão somente ele, poderá utilizar as formas previstas na Lei 8.213/91 e na IN INSS/PRES nº 31/2008, quais sejam:
- Aplicação do Nexo Profissional
- Aplicação do Nexo Individual ou
- Aplicação presumida do Nexo Técnico Epidemiológico
Após essa análise, inicia-se o processo administrativo relacionado ao caso concreto, o qual pode resultar em diversas consequências jurídicas para a empresa empregadora do beneficiário. Essas consequências incluem, entre outras, a revisão de benefícios concedidos, a responsabilização em termos previdenciários e fiscais, possíveis impactos na alíquota do SAT/FAP e implicações em demandas trabalhistas ou cíveis correlatas
2.2 – O QUE É NEXO TÉCNICO PREVIDENCIÁRIO (NTP) E QUAIS OS IMPACTOS PARA AS EMPRESAS?
Nexo Técnico Previdenciário (NTP) pode ser entendido como uma ferramenta utilizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (Autarquia Federal vinculada ao Ministério da Previdência Social) para avaliar eventual nexo causal entre patologia e atividade laboral, situação essa caracterizada unicamente pelo perito médico federal da Autarquia.
Nesse sentido, o principal objetivo do Nexo Técnico Previdenciário (NTP) é a uniformização e estabelecimento de critérios procedimentais para a caracterização de acidentes e doenças relacionadas ao labor.
Além do mais, como a atribuição de nexo causal independe da emissão do Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT), essa metodologia coíbe a ausência de notificação dos acidentes e doenças relacionas ao trabalho por parte dos empregadores.
Assim sendo, o Nexo Técnico Previdenciário (NTP) se divide em 3 (três) tipos, quais sejam:
- Nexo Profissional ou do trabalho (NP).
- Nexo Individual (NI).
- Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP).
Veja, a sigla NTEP não se confunde com a sigla NTP. NTP é o Gênero, do qual se retiram três espécies: NTEP, NP e NI.

Nexo Profissional ou do trabalho (NP):
(art. 20 da Lei 8213/91 e lista A e B do Anexo II do Decreto 3048/99)
De início, é necessário destacar que o conceito de doença profissional e doença do trabalho se distinguem, embora ambas sejam relacionadas ao ambiente laboral. Explico:
Doença profissional é aquela ligada ao exercício do trabalho em si, ou seja, às peculiaridades da atividade laboral, ou seja: a própria atividade do trabalho é a responsável pela doença.
Podemos citar, por exemplo um digitador que trabalha anos digitando sem pausas e desenvolve LER/DORT (lesão por esforço repetitivo). A LER/DORT é comum em profissionais que realizam movimentos repetitivos ou que mantêm a postura por longos período, sendo considerada uma enfermidade profissional.
Nota-se que, na hipótese narrada, o profissional repete o mesmo movimento durante anos, pois tal ato faz parte da sua profissão, o que pode acarretar uma enfermidade.
Doença do trabalho, por sua vez, é aquela relacionada às condições do ambiente de trabalho, mas não necessariamente atrelada a atividade exercida pelo trabalhador. A perda auditiva relacionada ao ambiente com muito ruído é um dos exemplos mais comuns.
Outro exemplo clássico de doença do trabalho é a Silicose, uma doença pulmonar causada pela inalação de poeira de sílica, comum em trabalhadores de mineração, construção civil e indústrias de cerâmica. Veja-se que, a enfermidade está relacionada as condições do ambiente de trabalho e não a atividade laborativa em si.
Em resumo, na doença profissional a causa é o próprio trabalho, já a doença do trabalho relaciona-se com o ambiente em que é exercido.
Contudo, em uma ou outra definição, exige a legislação, (art. 20 da Lei 8.213/91), que a enfermidade e seu fator de risco estejam previamente listados no Anexo II do Decreto 3.048/99.
- Lista A – Agentes ou Fatores de Risco de Natureza Ocupacional Relacionados Com a Etiologia de Doenças Profissionais e de Outras Doenças Relacionadas com o Trabalho.
- Lista B – Doenças Infecciosas e Parasitárias Relacionadas com o Trabalho.
Vale enfatizar que, as referidas listas (A e B) são exaustivas! ou seja, se a enfermidade que acomete o trabalhador não estiver presente em uma delas, não poderá ser aplicado o Nexo Profissional ao benefício.
Por fim, para a correta aplicação do nexo profissional ao caso concreto, faz-se necessário confirmar a presença do agente nocivo (ou fator de risco) no ambiente de trabalho, bem como é preciso que essa esteja prevista no Anexo II do Decreto 3.048/99.
Nexo Individual (NI):
(art. 19 e 21 da Lei 8213/91)
É aquele que decorre de acidentes do trabalho típicos ou de trajeto, bem como das condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele relacionado diretamente.
Pois bem, vamos a cada situação mencionada acima:
Acidente típico: é a forma de acidente mais comum. Ele ocorre no local da prestação de serviço e durante a execução das atividades laborais. Por exemplo:
- Queda de uma escada enquanto o trabalhador realiza suas tarefas.
- Queimadura durante a operação de uma máquina.
- Uma lesão causada pela queda de um objeto.
Ou seja, trata-se de um evento súbito e imprevisto, no local de trabalho e durante sua execução.
Acidente de trajeto: aquele que ocorre no percurso de deslocamento do empregado de sua residência para o trabalho ou vice-versa. Neste caso, é considerado acidente de trabalho se ele acontecer no trajeto habitual do empregado, sem desvios discrepantes. Além disso, o tempo de percurso do trajeto poderá ser avaliado para ver se é compatível com a distância percorrida diariamente.
Doença equiparada a acidente do trabalho: é o agravo decorrente das condições especiais em que o trabalho é realizado e que não esteja previsto nas listas A e B do Decreto 3.048/99.
Na hipótese de aplicação do Nexo Individual (NI), o médico perito do INSS tem, por obrigação, identificar a causa da lesão e a forma que verificou a lesão.
Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP):
(art. 21A da Lei 8213/91 e Lista C do Anexo II do Decreto 3048/99 criada pelo Dec. 6957 de 09/09/2009)
Trata-se de associação presumida entre o código (CID) e a atividade econômica desenvolvida (CNAE) pela empresa (art. 21-A da Lei 8.213/91 e Lista C do Anexo II do Decreto 3048/99 criada pelo Decreto 6.957/2009).
A aplicação do NTEP entrou em vigor em 01/04/2007, através do qual o médico perito do INSS pode caracterizar uma enfermidade como sendo “do trabalho” pela simples relação existente entre o CNAE da empresa e a CID da enfermidade incapacitante.
O NTEP é a mera identificação estatística da existência de riscos para o desenvolvimento de uma doença, o que não significa que este risco é, na realidade, um fator necessariamente causal da doença no caso concreto.
Na prática, quando o segurado comparece à perícia, o médico apenas cruza o código CID com o CNAE preponderante da empresa e confere a lista “C” do Anexo II, do Decreto 3.048/99.
Exemplo: trabalhador de um banco (CNAE 6422) que desenvolveu ansiedade (CID F41).

Nessa hipótese, consoante a lista acima, é possível cruzar a CID da patologia que acomete o obreiro com o CNAE do empregador, logo, o perito poderá conceder o benefício na espécie acidentária de forma presumida.
Ocorre dessa maneira, pois, o médico perito do INSS ao atribuir o referido nexo, não investiga absolutamente nada, ele apenas cruza a CID com o CNAE da empresa, confere a lista “C” do Anexo II, do Decreto 3.048/99 e concede o benefício na espécie acidentária, sendo por óbvio, direito da parte contraria contestar o nexo.
Melhor dizendo, como a aplicação do NTEP, o que sucede é a inversão do ônus da prova. Após isso, caberá ao empregador apresentar elementos capazes de afastar o nexo causal entre aquela enfermidade e o trabalho, como por exemplo uma Análise Ergonômica do Trabalho (AET) que indica a ausência de risco no trabalho do segurado, um relatório médico abordando a doença e possíveis causas extra laborais.
Obs: o empregador poderá apresentar esses documentos quando da defesa administrativa para os demais nexos também! (NP e NI), conforme restará demonstrado no tópico adiante.
Se o perito médico do INSS verificar que em determinado caso não é possível aplicar o NTEP pela impossibilidade de cruzar o código CID com o CNAE preponderante da empresa, ele poderá avaliar a possibilidade de aplicar o Nexo Profissional ou Individual, nos moldes dos tópicos anteriores.
Feita as considerações sobre os tipos de nexo (NP, NI e NTEP), entendo oportuno apresentar um quadro resumido que permite visualizar de maneira objetiva e comparativa as características de cada um, facilitando a compreensão e a aplicação desses conceitos aos casos concretos.
| Tipo de nexo | Quando se aplica | Exemplos | Como o INSS reconhece |
|---|---|---|---|
| Nexo Profissional | Quando a doença é típica da profissão, causada pela própria atividade. | Digitador com LER/DORT; | Verifica se a doença e o agente de risco estão na Lista A ou B do Anexo II do Decreto 3.048/99. |
| Nexo Individual | Quando há acidente de trabalho, acidente de trajeto ou doença causada por condições específicas, mesmo fora da lista do NP. | Queda de escada no trabalho; Acidente de carro no trajeto; | Avaliação individual do caso pelo médico perito, com base em documentos e relatos. |
| Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário | Quando existe presunção estatística de que a doença está ligada à atividade da empresa. | Ansiedade (CID F41) em bancários (CNAE 6422). | O perito cruza o CID da doença com o CNAE da empresa na Lista C do Anexo II do Decreto 3.048/99. |
3 – POSSIBILIDADE DE INSURGÊNCIA ADMINISTRATIVA DO EMPREGADOR E IMPORTÂNCIA DO MONITORAMENTO DOS AFASTAMENTOS POR PARTE DA EMPRESA:
Vale destacar que, em nenhuma das hipóteses mencionadas acima, o nexo técnico aplicado é absoluto. A empresa pode e deve apresentar impugnação na via administrativa para os casos em que discordar da atribuição acidentária. Para tanto, é fundamental que a empresa consulte e monitore a espécie dos benefícios concedidos aos seus empregados.
O monitoramento deverá ser realizado por intermédio do site “DATAPREV”. Dataprev é sigla para Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social.
Neste site é possível que o empregador consulte os Benefícios por Incapacidade, Pensões por Morte Acidentárias, Aposentadorias e Antecipações de auxílio por incapacidade temporária, solicitadas por seus empregados. Ao acessá-lo, deverá ser inserido o login e senha da empresa. Caso não possua, deverá realizar o cadastramento.
Obs: O site do Governo sofre alterações com frequência, razão pela qual não irei abordar o passo a passo para o cadastramento. Eventual orientação desatualizada poderá ser contraproducente. Todavia, basta entrar em contato com SAC do site que irão informar o método vigente.
Ato contínuo, relevância da insurgência administrativa reside no fato de que a atribuição de nexo causal entre a patologia e o trabalho — independentemente do tipo de Nexo Técnico Previdenciário aplicado — pode gerar uma série de impactos significativos para a empresa. Entre os principais, destacam-se:
- Recolhimento do FGTS mensal do colaborador, durante o período que estiver afastado;
- Garantia do emprego ao trabalhador até 12 meses após a cessação do benefício acidentário;
- Influência deste benefício na variação do Fator Acidentário de Prevenção (FAP), refletindo assim, em uma contribuição maior do Seguro contra Acidentes de Trabalho (SAT).
- Possibilidade de responsabilidade civil;
- Possibilidade de ajuizamento de ação regressiva.
- Possibilidade de Reclamatória trabalhista – indenização e reintegração.
Nota-se que a concessão de um benefício por incapacidade é um evento eminentemente previdenciário, porém com potencial de acarretar uma série de consequências para os demais setores da empresa, envolvendo o jurídico trabalhista, tributário, recursos humanos, medicina e segurança do trabalho.
Sucede-se que, não raras as vezes a Autarquia Previdenciária comete equívocos ao conceder um benefício em espécie acidentária para o segurado/empregado, quando na verdade deveria ter sido concedido em espécie previdenciária (não acidentária).
Isso pode ocorrer por diversos fatores, seja porque o trabalhador compareceu na perícia munido de uma CAT emitida por terceiro, seja pelos relatos do segurado, ou seja, pela simples presunção.
Pertinente enfatizar um ponto, mesmo que o trabalhador tenha apresentado um Comunicado de Acidente de trabalho (CAT) emitido por terceiro ao INSS, a empresa poderá impugnar a acidentalidade.
Diversamente da CAT produzida pelo empregador (que é prejudicado com a medida e, em princípio, não teria razões para fazê-lo em falseamento da verdade), aquela emitida pelo empregado/sindicato/Cerest/autoridade médica advém de informações unilateralmente prestadas pelo próprio interessado, tendo valor probatório irrisório. Tomá-la como prova da ocorrência do acidente seria como aceitar o narrado na pela parte como comprovação da verdade dos fatos.
Sendo assim, sempre que um colaborador tiver um benefício em espécie acidentária concedido a seu favor, a empresa deverá verificar a pertinência do enquadramento acidentário e, caso não concorde com a alegação de que o trabalho tenha adoecido e/ou lesionado o obreiro, deverá apresentar defesa na via administrativa.
No caso de aplicação do Nexo Profissional (NP) ou do Nexo Individual (NI), é cabível a interposição de Recurso Ordinário no prazo de 30 (trinta) dias, contados da ciência da decisão, perante o Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS).
Contra a decisão de indeferimento desse recurso, é possível apresentar Embargos de Declaração, no prazo de 10 (dez) dias, e/ou Recurso Especial, no prazo de 30 (trinta) dias, cujo julgamento será realizado pelas Câmaras de Julgamento. Da decisão do Recurso Especial, caberá novamente a interposição de Embargos de Declaração, também no prazo de 10 (dez) dias.
Por outro lado, no caso de aplicação do Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP), o interessado poderá apresentar Contestação no prazo de 15 (quinze) dias, perante a Agência da Previdência Social (APS) que concedeu o benefício ao trabalhador.
Em caso de indeferimento da contestação relativa ao NTEP, caberá a interposição de Recurso Ordinário, seguindo-se, a partir desse ponto, o mesmo trâmite procedimental previsto para o Nexo Profissional e o Nexo Individual.
Ficando o processo administrativo da seguinte forma:
- NP e NI
- Recurso Ordinário (Junta de Recursos)
- Embargos de Declaração
- Recurso Especial (CAJ)
- Embargos de Declaração
- Recurso Especial (CAJ)
- Embargos de Declaração
- NTEP
- Contestação (APS)
- Recurso Ordinário (Junta de Recursos)
- Embargos de Declaração
- Recurso Especial (CAJ)
- Embargos de Declaração
- Recurso Especial (CAJ)
- Embargos de Declaração
- Recurso Ordinário (Junta de Recursos)
Para a defesa administrativa (qualquer uma delas), são importantes os seguintes documentos probatórios:
- Ficha de registro
- ASOs;
- PPP
- LTCAT, PPRA e PCMSO (mais recente)
- Documentos médicos.
- Parecer do médico do trabalho da empresa.
- Informações sobre seu histórico profissional na empresa;
- Passado laborativo do segurado (quando houver)
- Histórico de atividades extra laborais
Obs: não são documentos obrigatórios, mas sim documentos pertinentes. A defesa pode ser realizada com ou sem eles.
Após a apresentação da insurgência administrativa, o INSS possui, em regra, o prazo de 30 dias, conforme previsto na Lei nº 9.784/1999, para analisar e julgar o recurso apresentado. Caso esse prazo não seja respeitado, a empresa pode recorrer ao Poder Judiciário para garantir seu direito, sendo o Mandado de Segurança uma medida adequada para compelir a autarquia a analisar e decidir sobre a defesa administrativa relativa ao benefício concedido ao segurado — trabalhador da empresa.
A ilegalidade da conduta do INSS decorre do fato de que mesmo nos processos administrativos devem ser observados os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, bem como os preceitos do devido processo legal e da razoável duração do processo. A inobservância desses princípios caracteriza descumprimento legal, especialmente quando o INSS deixa de respeitar o prazo máximo para resposta ao recurso administrativo interposto pela empresa.
Nessa hipótese, há flagrante violação da Lei nº 9.784/1999 e da legislação previdenciária pertinente, configurando ilegalidade na conduta da autarquia e justificando a adoção de medidas judiciais para assegurar que o processo administrativo seja analisado e julgado de forma tempestiva e adequada, garantindo à empresa a possibilidade de defesa e proteção de seus interesses.
CONCLUSÃO
Embora seja de extrema relevância que as empresas compreendam o Nexo Técnico Previdenciário (NTP) e se posicionem diante de eventuais incorreções do INSS, trata-se de uma área do direito relativamente nichada, na qual os conteúdos didáticos são ainda escassos e pouco acessíveis. Essa lacuna reforça a necessidade de estudo e acompanhamento constante por parte das empresas, especialmente no que diz respeito às consequências práticas da aplicação incorreta do nexo técnico.
Como demonstrado, a concessão de benefícios na espécie acidentária, quando realizada de forma inadequada, pode gerar prejuízos significativos e injustos para os empregadores, seja em termos financeiros, seja em implicações previdenciárias e fiscais. Por isso, é essencial que a empresa esteja atualizada, compreenda os diferentes tipos de nexos técnicos aplicáveis e conheça os procedimentos administrativos e prazos legais, de modo a poder oferecer uma defesa adequada e fundamentada caso a caso.
Ademais, é um direito do empregador solicitar investigação criteriosa sobre afastamentos e concessão de benefícios de seus trabalhadores. Tal atuação não tem como objetivo suspender direitos do trabalhador ou contestar a existência da enfermidade que o acometeu, mas sim garantir que a concessão seja realizada de forma coerente, justa e em conformidade com a natureza correta do benefício — acidentário ou previdenciário.
Portanto, o conhecimento aprofundado sobre o NTP, suas modalidades, efeitos e estratégias de defesa, aliado à atuação preventiva e reativa da empresa, é essencial para minimizar riscos legais, preservar a saúde financeira e administrativa da organização e, ao mesmo tempo, assegurar que os direitos dos trabalhadores sejam respeitados de forma equilibrada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999. Regulamenta a Previdência Social, aprova o Regulamento da Previdência Social (RPS) e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 7 maio 1999.
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 25 jul. 1991.
BRASIL. Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Instrução Normativa PRES/INSS nº 128, de 28 de março de 2022. Disciplina as regras, procedimentos e rotinas necessárias à efetiva aplicação das normas de direito previdenciário. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 29 mar. 2022.
Conselho de Recursos da Previdência Social. Regimento Interno do Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS: Portaria MTP nº 4.061, de 12 de dezembro de 2022, alterada pela Portaria MPS nº 2.393, de 5 de julho de 2023: versão compilada. Brasília, 2024.
COSTA, Anderson Angelo Vianna da. Gestão dos Afastamentos e dos Benefícios Previdenciários. 2. ed. São Paulo: LuJur Editora, 2020.
VILELA VIANNA, Cláudia Salles. Acidente do Trabalho: Abordagem Completa e Atualizada. 2. ed. São Paulo: LTr, 2017.
1 Guilherme Vinicius Theodoro é Graduado em Direito pelo UNIFAPI; Pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela Escola Superior de Advocacia; Pós-graduado em Advocacia Cível (Lato Sensu) pela Fundação Escola Superior do Ministério Público; Pós-graduando em Direito e Processo Previdenciário pela Damásio Educacional; Advogado no escritório Vilela Vianna Advocacia e Consultoria.
2 A Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) é o documento previsto na legislação previdenciária para registrar perante o INSS a ocorrência de acidente típico, de trajeto ou doença ocupacional. Embora qualquer pessoa possa formalizar a comunicação (inclusive o próprio segurado, sindicato ou médico), na prática a emissão pela empresa costuma ocorrer apenas quando há concordância quanto à existência do acidente/doença. Nessas hipóteses, a empresa não apresenta defesa na via administrativa.
3 https://www3.dataprev.gov.br/conadem/consultaauxdoenca.asp